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Quadro Comparativo – Calvinismo x Arminianismo

Quadro Comparativo – Calvinismo x Arminianismo

Você certamente já ouviu falar sobre o Calvinismo e o Arminianismo. Não são poucos os debates (acalorados e, às vezes até hostil) acerca desse assunto.

Importante: [Leia as Notas de Rodapé disponível após o final do texto para melhor compreensão do assunto]

Mas em que consiste tais conceitos?

Vamos fazer aqui um breve resumo e comparativo entre o Calvinismo e o Arminianismo que são os dois sistemas teológicos mais conhecidos entre os protestantes que tentam explicar a relação entre a soberania de Deus e a responsabilidade humana em relação à salvação.

João Calvino foi um teólogo francês que viveu entre 1.509–1.564 d.C. Sua linha soteriológica é totalmente monergista[1] considerando Deus como o único agente na salvação sem que o homem necessite ou consiga fazer algo durante o processo. A doutrina desenvolvida por ele recebe

O acróstico TULIP é usado para memorizar os 5 pontos usados no sistema calvinista:

Total depravity (Depravação total);

Unconditional election (Eleição incondicional);

Limited atonement (Expiação limitada);

Irresistible grace (Graça irresistível;

Perseverance of the Saints (Perseverança dos santos).

Jacob Armínio foi um teólogo holandês que viveu entre 1.560–1.609 d.C. Diferente de seu antecessor, demonstrou uma soteriologia sinergista[2] onde Deus inicia o processo da salvação atuando sobre o homem a graça preveniente que é a preparação e o chamado de Deus para salvar o homem, mas ela pode ser resistida[3]. Logo o homem precisa responder a esse chamamento positivamente para que seja salvo.

O acróstico FACTS é usado para memorizar os 5 pontos do Arminianismo:

Freed by grace (to believe) Feito livre pela graça (para crer);

Atonement for all (Expiação por todos);

Conditional election (Eleição condicional);

Total Depravity (Total depravação);

Security in Christ (Segurança em Cristo)

Os dois sistemas podem ser resumidos nesses cinco pontos.

CALVINISMOARMINIANISMO
Depravação Total cada aspecto da humanidade está contaminado pelo pecado, e por isso, os seres humanos são incapazes de vir a Deus por iniciativa própria.Depravação Total[4] (Arminianos Clássicos) Defende que cada aspecto do homem está contaminado pelo pecado. Dessa forma ele só pode crer em Cristo quando é capacitado por Deus.
Eleição Incondicional afirma que Deus elege pessoas para a salvação baseado inteiramente em Sua vontade, e não em nada que seja inerente à pessoa.Eleição Condicional Deus elege pessoas para a salvação baseado em sua pré-ciência de quem crerá em Cristo para a salvação.
Expiação Limitada Os calvinistas acreditam que Jesus morreu apenas pelos eleitos.Expiação Ilimitada Jesus morreu por todos[5], mas que Sua morte não tem efeito enquanto a pessoa não crê.
Graça Irresistível defende que quando Deus chama alguém para a salvação, esta pessoa inevitavelmente virá para a salvação.Graça Resistível Deus chama a todos para a salvação, mas muitas pessoas resistem e rejeitam este chamado.
Perseverança dos Santos se refere ao conceito de que a pessoa que é eleita por Deus irá perseverar em fé e nunca negará a Cristo ou se desviar Dele.Segurança em Cristo[6] é a visão de que um crente em Cristo pode, por seu livre arbítrio, se desviar de Cristo e, assim, perder a salvação.

Na diversidade do Corpo de Cristo, muitos crentes chegam a um tipo de mistura entre os pontos das duas visões admitindo estar entre uma e outra em determinados pontos, enquanto outros mais radicais sustentam totalmente apenas uma dessas linhas soteriológicas não aceitando quaisquer acordo entre ambas posições.

A Falácia do Arminianismo ser compatível com o Semipelagianismo

O Semipelagianismo é um sistema doutrinário herético uma vez que prega a ideia de que dentro do plano de salvação é o homem quem inicia o processo e Deus responde ao homem. Todo teólogo ou seminarista, deveria saber que, evidentemente Armínio jamais concordaria com tais afirmações pois o arminianismo prega exatamente o oposto disso!

Tal doutrina [semipelagianismo] nega que necessite da primeira ação da graça de Deus sobre o homem para responder com fé e arrependimento à pregação do Evangelho; além disso, diz que Deus poderia até dar início à fé em alguns casos, mas em muitos outros, ou na maioria, era do próprio homem o initium fidei, isto é, a disposição para abraçar a salvação.

Volta e meia os arminianos são alvo de uma falácia atrelando-os ao semipelagianismo. Isso se dá por parte dos calvinistas, que pelo completo desconhecimento acerca do que Armínio realmente escreveu e, baseando-se em o que outros calvinistas e até alguns arminianos disseram acerca dele distorcem a base doutrinária de Armínio.

O sistema soteriológico de interpretação conhecido como Arminianismo não recebe esse nome por ter sido criado por Armínio, mas por ter sido ele o responsável por agrupar informações deixadas por outros grandes teólogos. Armínio expôs habilmente as ideias que defendeu, pois, seus pressupostos  foram defendidos anteriormente por doutores da Igreja que floresceram antes mesmo de Agostinho, por exemplo Crisóstomo e outros patriarcas gregos contemporâneos. Antes de Armínio descartar os pontos de vista de Calvino, em oposição à predestinação absoluta, e geralmente em oposição à redenção particular suas bases teológicas estão ligadas a Erasmo, Melâncton, Hemmingius, Snecanus, Latimer, e por muitos outros teólogos eminentes em diferentes partes da Europa, antes de 1589.

É importante deixar claro que alguns que se dizem “arminianos” evidenciam não terem lido os escritos de Armínio e parecem aderir inconscientemente a ensinamentos semipelagianos. Daí o oportunismo de teólogos calvinistas em associá-los ao arminianismo. Mas essa tática não é correta, uma vez que não se pode acusar o sistema de interpretação de Armínio com base nos desvios doutrinários destes que evidentemente chocam com a ideia original. Por isso, uma investigação adequada sobre um determinado sistema teológico tornará as discussões com os pontos de vista opostos muito mais intelectualmente honestas e respeitáveis.

Veja por exemplo o que Armínio disse acerca da Depravação Total:

Neste estado [caído], o livre-arbítrio do homem para o verdadeiro bem não está apenas ferido, enfermo, inclinado, e enfraquecido; mas ele está também preso, destruído, e perdido. E os seus poderes não só estão debilitados e inúteis a menos que seja assistido pela graça, mas não tem poder algum exceto quando é animado pela graça divina.[7]

Em perfeita harmonia com o pensamento de Armínio, H. Orton Wiley afirmou que: “Depravação é total na medida em que afeta todo o ser do homem”.[8]

Ainda quanto à questão da Depravação Total, o teólogo arminiano, Roger Olson, defende a si próprio e ao Arminianismo com a seguinte afirmação: “Arminianos … de forma alguma negam a depravação total (mesmo que prefiram outro termo para designar a impotência espiritual humana) ou a absoluta necessidade da graça sobrenatural até mesmo para o exercício de uma primeira boa vontade em direção a Deus.”[9]

Não é à toa que os calvinistas que escreveram o livro “Por que eu não sou um arminiano[10]”, concluíram que os “arminianos juntamente com calvinistas acreditam na depravação total”.

É fato que a chave para o entendimento da doutrina arminiana é entender a doutrina da “graça preveniente”[11]. Armínio declara:

Em seu estado caído e pecaminoso, o homem não é capaz, de e por si mesmo, pensar, desejar, ou fazer aquilo que é realmente bom; mas é necessário que ele seja regenerado e renovado em seu intelecto, afeições ou vontade, e em todos os seus poderes, por Deus em Cristo através do Espírito Santo, para que ele possa ser capacitado corretamente a entender, avaliar, considerar, desejar, e executar o que quer que seja verdadeiramente bom. Quando ele é feito participante desta regeneração ou renovação, eu considero que, visto que ele está liberto do pecado, ele é capaz de pensar, desejar e fazer aquilo que é bom, todavia não sem a ajuda contínua da Graça.[12]

Quanto à Perseverança dos Santos; isso é, a possibilidade de o crente perder ou não a salvação, Armínio não concluiu esse assunto pois, ao que parece não era dogmático sobre sua posição uma vez que ele “nunca ensinou” a perseverança condicional [perda de salvação] dos eleitos. Em seus escritos lemos a seguinte informação:

“Eu nunca ensinei que um verdadeiro crente pode total ou finalmente cair da fé e perecer; mas não vou esconder que há passagens da Escritura que me parecem mostrar esse aspecto […] por outro lado, certas passagens são fornecidas para a doutrina contrária [da perseverança incondicional] que merecem especial consideração”[13]

O entendimento arminiano de “graça preveniente” rejeita a noção de que a vontade do homem é livre e capaz de responder com fé salvadora por sua própria ação. Ou seja, o homem depende inicialmente da ação da graça de Deus para que então ele possa respondê-la. Há, sem dúvida, como H. Orton Wiley afirma, “A cooperação da vontade humana” envolvida na resposta à mensagem de salvação de Deus, mas “cada movimento da alma em direção à Deus é iniciado pela graça divina”. [14]

Por essa declarações, percebemos que o Semipelagianismo e Arminianismo não são sequer compatíveis desde o início de sua formatação.



[1] MONERGISMO – [Do gr. monós, único + ergon, trabalho] Doutrina que atribui a conversão do ser humano única e exclusivamente ao Espírito Santo. (ANDRADE, 1998, p. 216). Nesse caso o homem não precisa nem pode cooperar com Deus no tocante ao processo de salvação. É importante distinguir aqui a distinção entre o monergismo calvinista, que coloca Deus como o único agente da salvação e o monergismo de Pelágio que coloca o homem como o agente no processo de salvação.

[2] SINERGISMO – [Do gr. συν sun, união + ergon, trabalho] “Conceito de que o humano trabalha com Deus em certos aspectos da salvação, como a fé ou a regeneração.” (ERICKSON, 2011, p. 182) – Termos que demonstram o sinergismo na propagação do Evangelho são encontrados em 1Coríntios 3.9 συνεργοί θεοῦ “sunergoi theou” (cooperadores de Deus), e em 2Coríntios 6.1  Συνεργοῦντες “sunergountes” (cooperando) “na qualidade de cooperadores”, i.e., com Deus. Assim como no caso do monergismo calvinista e pelagiano, é importante distinguir o sinergismo de Armínio, os remonstrantes, John Wesley e os metodistas, que é o sinergismo evangélico onde Deus sempre é o agente inicial que nada tem a ver com o sinergismo dos semipelagianos que coloca o homem como o agente inicial.

[3] A GRAÇA RESISTIDA – “estes resistem à verdade” (2 Timóteo 3.8) como Alexandre, o latoeiro que “resistiu muito às nossas palavras.”  (2 Timóteo 4:15) contudo Paulo mesmo diz para Timóteo continuar “instruindo com mansidão os que resistem, a ver se porventura Deus lhes dará arrependimento para conhecerem a verdade” (2 Timóteo 2:25). Enquanto o procônsul Sérgio Paulo ouvir a palavra de Deus. procurava muito ouvir a palavra de Deus.” o encantador “resistia-lhes… procurando apartar da fé o procônsul.” (Atos 13.7,8). “E em nada vos espanteis dos que resistem, o que para eles, na verdade, é indício de perdição, mas para vós de salvação, e isto de Deus.” (Filipenses 1.28). “E, quando Silas e Timóteo desceram da Macedônia, foi Paulo impulsionado no espírito, testificando aos judeus que Jesus era o Cristo. Mas, resistindo e blasfemando eles, sacudiu as vestes, e disse-lhes: O vosso sangue seja sobre a vossa cabeça; eu estou limpo, e desde agora parto para os gentios.” (Atos 18.5,6). Muitos líderes judeus resistiram: “Homens de dura cerviz, e incircuncisos de coração e ouvido, vós sempre resistis ao Espírito Santo; assim vós sois como vossos pais.” (Atos 7.51)

[4] DEPRAVAÇÃO TOTAL – O arminianismo clássico defende a ideia da “Depravação Total” a qual Armínio denominava “Inabilidade total” e, embora alguns arminianos posteriormente possam defender uma “Depravação Parcial” esse não é o posicionamento original de Jacob Armínio.

[5] CRISTO MORREU POR TODOS OS HOMENS – Cristo faz provisão para todos os homens sendo efetivo sobre aquele que crê. “Porque a graça de Deus se manifestou salvadora a todos os homens.” (Tito 2:11, NVI). “Deus prova o seu amor para conosco, em que Cristo morreu por nós, sendo nós ainda pecadores.” (Romanos 5.8). Assim temos um “Deus vivo, o Salvador de todos os homens, especialmente dos que crêem.” (1 Timóteo 4:10). Por isso Cristo é apresentado como “a luz verdadeira, que ilumina a todo o homem que vem ao mundo.” (João 1.9). “Porque isto é bom e agradável diante de Deus nosso Salvador, que quer que todos os homens se salvem, e venham ao conhecimento da verdade.” (1 Timóteo 2.3,4).

[6] PERSEVERANÇA DOS SANTOS – O próprio Armínio não chegou a se posicionar se o cristão pode ou não cair da graça. Se são “eleitos, segundo a presciência” (1 Pedro 1.2) que é um atributo infalível de Deus, não existe a possibilidade de um eleito perder a salvação. Assim é mantida uma distinção entre crentes e eleitos. Um crente pode cair, mas um eleito não pode pois pela presciência divina é constatado que perseverou até o fim. A Segurança em Cristo portanto defende a Perseverança dos santos distinguindo entre os crentes e os eleitos. A Perseverança dos santos aplica-se pela presciência divina aos eleitos.

[7] Jacobus Arminius, Works, trans. James Nichols(Grand Rapids, MI: Baker Book House, 1956), 2:192.

[8] H. Orton Wiley, Christian Theology (Kansas City, MO: Beacon Hill, 1941), 2:98.

[9] Roger Olson, Arminian Theology: Myths and Realities, 17.

[10] Robert A. Peterson and Michael D. Williams, Why I Am Not an Arminian (Downers Grove: Ill.: InterVarsity Press, 2004), 163.

[11] GRAÇA PREVENIENTE. No movimento wesleyano ou no arminianismo, a crença de que, embora todas as pessoas iniciem a vida com uma natureza pecaminosa, Deus restaura cada indivíduo a um ponto no qual existe suficiente capacidade de crer. | GRAÇA COMUM. Graça estendida a todas as pessoas por meio da providência geral de Deus, como a provisão de sol e chuva para todos. No pensamento de John Wesley, o termo pode referir-se à graça preveniente que vem sobre todas as pessoas e as restaura a um ponto no qual sejam capazes de crer. (ERICKSON, M. J. Dicionário popular de teologia. 1ª. ed. São Paulo: Mundo Cristão, 2011, p. 87,88.). Vale ressaltar que o calvinismo entende que Deus dá graça comum para todos os homens, mas a graça especial ou eficaz (a salvação) ele dá somente aos eleitos.

[12] Jacobus Arminius, Works, 1:252.

[13] Jacobus Arminius, Works, 1:254.

[14] H. Orton Wiley, Christian Theology, 2:356.


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Bibliografia

ANDRADE, C. C. Dicionário Teológico. Edição Revista e Ampliada. ed. Rio de Janeiro: CPAD, 1998.

ERICKSON, M. J. Dicionário popular de teologia. Tradução de Emirson JUSTINO. 1ª. ed. São Paulo: Mundo Cristão, 2011.


Escrito por
Pr. Felipe Morais
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